quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Relato Pessoal

Eduarda Arfer Jurum Juntá Tuxá
Índia Tuxá,18 anos.
Sou mulher, jovem, indígena do povo Tuxá, cotista e estudante de Direito na Universidade Estadual de Feira de Santana, ingressei nesta instituição através do processo seletivo de 2012.1, a partir daí, abri meus olhos para um novo mundo: o mundo universitário.

Cheguei aqui com uma bagagem pesada por anseios, vontades, ilusões e, além disso, com a certeza que trago um diferencial, a responsabilidade que tenho com a história, não apenas com o povo Tuxá, qual pertenço, mas com os povos indígenas como um todo, com a história de luta vivida ao longo dos tempos.

Ao bater na porta da universidade a primeira coisa que pensei foi: E agora, Tupã? Como posso enfrentar o monstro do preconceito, que já é tão comum nas ruas? Aqui não há de ser diferente, então, logo pensei:Aqui deve ser diferente, sim! São pessoas intelectuais, cheias de cultura, universitários, certo?! E aí é que está o problema, eu me enganei!

Assim,como em todos os lugares por onde meus pés pisaram,encontrei aqui também o respeito e o preconceito, opondo-se entre si. De cara somos bombardeados por uma enxurrada de perguntas descontextualizadas do que realmente somos, e agente ainda meio tonto vai respondendo coisas como: “Não, eu não sou do Amazonas”, “Não, eu não moro em oca”, “Não, eu não ando nua lá”, “Não, agente não só come peixe e mandioca” e por aí segue, daí eu me pergunto, porque será que não retificam as perguntas?Poxa! Eu quero também poder dar respostas positivas!

Qual é? Que é isso? Agente vive essa ditadura há séculos! Estereotipados no imaginário dos Brasileiros, índio selvagem, índio burro, tira índio daqui, coloca índio ali, índio, o sinônimo de preguiça. E o índio que tem a difícil missão de enfrentar os centros urbanos, as universidades, em busca de dar o sinal de alerta:“Oi, estamos aqui! Estamos morrendo, estamos perdendo nossas terras pra fazendeiros, produtores de cana! Acorda, mais uma hidrelétrica quer levar nossa mãe terra”, é este índio, o ousado, que tomba de cara com o racismo e a discriminação.

O render-se ou o lutar é a maior de todas as nossas dúvidas, somos nós, universitários indígenas que abrimos alas para uma mudança na história, eu quero o meu povo aqui dentro e em todas as outras universidades, sejam públicas, privadas ou federais, eu quero poder dizer que também somos capazes, tão iguais e merecedores de voz e vez como todos os outros; Lembro-me da fala do meu parente Pataxó, estudante da UFBA, em que ele diz querer Índios doutores e não doutores em índio; é nessa frase que mora o nosso sonho, poder no futuro contar nossa luta à nossa maneira, no olhar de quem vê de dentro, e não dos olhos azuis que tantas vezes nos corrompe.

Se formos diminuídos, ignorados ou questionados dentro dos corredores ou nas salas de aulas, isso não é importante, o preconceito mora na casa da ignorância, e essa luta nós venceremos ao lado de Tupã, diferente do que pensam alguns, somos índios também em essência, nada tira de nós ou corrompe o que somos, o conhecimento aqui adquirido não apaga a sabedoria expressa na água doce de pote que bebi na minha aldeia, mas soma-se a ele.

Acredito que a cada estudante indígena que ingressa neste meio universitário é uma nova oportunidade para romper com estas falsas ideias de que índio bom é o índio distante, que não questiona, o índio enfeitado na estante ou preso nas telas de um belo quadro, pois, índio bom,para mim, é aquele que luta e se mostra presente!

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